Marisa Monte conversa com exclusividade com a BBMag

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A cantora Marisa Monte, ganhadora de quatro prêmios Grammy Latino, entre diversos outros, concedeu uma entrevista exclusiva à BBMag

Há uma semana de ter lançado seu novo álbum “Portas”, Marisa Monte nos contou sobre sua infância, influências, processo criativo durante a pandemia, projetos e muito mais. Confira esse bate-papo!

BBMag: Primeiro que tudo, Marisa, obrigado pela sua disponibilidade. Nossa revista é uma publicação somente de conteúdo positivo, não falamos de desgraças, a gente fala só de coisas boas, um lado mais alegre e brilhante de tudo.

Marisa: Adorei isso! Não está faltando mais nada disso (desgraças) no mundo!

BBMag: Conta pra gente um pouquinho sobre você, sua família, onde nasceu e cresceu…

Marisa: Sou carioca. Nasci no Rio de Janeiro, cresci e estudei aqui. Comecei a me interessar por música na infância e com 14 anos já estudava música, quando os amigos da escola começaram a pedir pra cantar pra eles e, de lá pra cá, meus amigos seguem pedindo e eu sigo cantando (rs). Estudei canto fora (Itália) dos 18 aos 19, e na minha volta me tornei conhecida muito rápido, lançando meu primeiro álbum aos 20 anos. São 34 anos de carreira já, com muitos discos, colaborações, turnês, shows e muitas músicas que não são mais minhas, que já fazem parte da vida das pessoas, que estão aí no mundo, que já foram muito além da minha presença física, ocupando espaços onde eu nunca poderia estar.

BBMag: De onde surgiu a sua “veia artística”? Quais foram as suas principais influências?

Marisa: Eu estudei música em Roma durante um ano. Mas eu nasci em uma casa onde meu pai gostava muito de música, ele comprava muitos LPs e era conectado ao Departamento Cultural da Portela e fazia parte do grupo de jovens que valorizava a cultura popular aqui no Rio e cultuavam o samba, que é a principal forma de expressão aqui do Rio de Janeiro. Então eu cresci em uma casa portelense, uma casa em que se ouvia muita música brasileira. Cresci conhecendo e valorizando esses grandes mestres: Cartola, Nelson Cavaquinho, Candeia, Paulinho da Viola, Clara Nunes, Beth Carvalho, além de Elis Regina, Caetano, Gil e algumas coisas de jazz, música clássica… E a partir da adolescência fui buscando meus próprios caminhos, fiz muitas pesquisas em sebos, em coleções de amigos, edições raras… Estamos falando de LPs, não existia ainda os CDs. Me interessei pela música brasileira dos anos 20, 30, 40, 50, em um período pré-bossa nova. Estudei de uma forma autodidata. E junto com isso, toda a informação da minha geração, as coisas que se ouviam pelo mundo: Bob Marley, Steve Wonder, Beatles, Rolling Stones, Janis Joplin. Sendo brasileira, desse país enorme, com tantas vertentes culturais diferentes, é muito difícil destacar somente um estilo porque cada parte do Brasil tem uma música própria interessante. É um país muito diverso culturalmente e muito misturado também. A gente tem essa característica antropofágica de absorver características externas, procesar internamente e transformar em estilos originais aqui dentro. Cresci em um país onde tem samba-rock, samba-funk, samba-jazz, bossa nova,  samba-reagge, soul-brasileiro, então eu destacaria como minhas principais influências culturais a mistura e a diversidade. E acho que a minha música reflete isso.

BBMag: O Brasil é um país tão grande e as pessoas às vezes não entendem que cada região tem a sua característica típica e tradicional.

Marisa: O que ficou famoso sobre o Brasil no mundo eram as coisas produzidas no Rio de Janeiro, que era o grande porto pro mundo e a capital até os anos 60. Daí o samba ter representado o Brasil no mundo e a bossa nova também! Mas se você viajar pelo país, vai ver coisas incríveis: o forró, o xote, o xaxado, muitos estilos que são tão importantes e tão interessantes e originais quanto. Também é o caso da feijoada, representante da culinária brasileira pelo fato de que os estrangeiros chegavam pelo Rio,  qualquer pessoa que viesse conhecer o Brasil entrava pelo Rio de Janeiro, então alguns dos aspectos que temos aqui viraram sinônimo de cultura brasileira.

BBMag: Você tem um estilo musical preferido ou gosta de uma mistura de tudo?

Marisa: Eu gosto de tudo! Me identifico como uma cantora tradicional, ligada à tradição da canção e a música para ser cantada. Música que tenha essa característica de ter letra, melodia, poesia. A voz é o único instrumento que articula palavras. Sou dessa tradição: a música para o canto.

BBMag: Hoje, com a pandemia, tem sido um momento incrivelmente difícil para os artistas da indústria musical em todo o mundo. Como isso afetou o seu trabalho?

Marisa: Quando começou a pandemia, eu não tinha nenhum show marcado,  tinha feito meu último show em fevereiro, em Fortaleza, e já estava com repertório pronto pra entrar em estúdio para gravar, então naquele primeiro momento deu para absorver bem.. Nunca fiquei na minha vida profissional tanto tempo sem viajar, fazer show… Estava preparada pra gravar e lançar um álbum no ano passado, mas, obviamente, não foi possível. Esperamos até novembro pra entrar no estúdio, entendendo melhor os protocolos sanitários para não colocar ninguém em risco, fazendo pequenos períodos de gravação, distanciamento, pequenos grupos.. Nesse período, fiz outras músicas e gravei mais. Resolvemos arriscar e depois de gravar no Brasil fizemos uma sessão remota em Nova Iorque, com meu amigo Arto Lindsen, que já produziu alguns discos meus e juntou uma banda na Rua 37 e coproduziu duas faixas comigo. Pelo Zoom, como estamos aqui. E deu super certo! A partir disso, seguimos misturando gravações presenciais no Rio, com gravações remotas em Lisboa, Madri, Los Angeles, mixamos em Nova Iorque, Los Angeles e Rio, continuando com o sistema híbrido, entre o remoto e o presencial. Tive que adaptar meu método de produção, ser mais criativa. O que mais afetou foi essa paralisia geral, e os mais prejudicados nem são os músicos e sim os técnicos e pessoas que trabalham exclusivamente nisso. O impacto é gigante em tudo que envolve encontro, audiência, coletividade.

BBMag: Você tem uma longa carreira na indústria musical que inclui quatro Grammy Latino. Como você consegue sustentar essa longevidade?

Marisa: Eu acho que mantendo o prazer naquilo que faço. Isso se imprime no trabalho, passa para as pessoas. Tendo a vontade de fazer coisas diferente e indo em busca de fazer coisas cada vez melhores. E muito trabalho! Seja um esforço criativo, intelectual, artístico e físico também! É isso. Mantendo o prazer, mantendo viva essa chama criativa. Quando vejo uma pessoa bem-sucedida, em qualquer área, sempre penso: “Essa trabalha!”

BBMag: Você está com um novo álbum chamado “Portas”. Conta um pouco sobre ele pra gente.

Marisa: Essas canções eu vinha compondo nos últimos anos, entre turnês, encontros, outros projetos colaborativos que fiz, Tribalistas, discos ao vivo… Uma boa parte desse repertório tem entre 3 e 5 anos e algumas outras fiz durante a pandemia. E eu quis, de alguma maneira, conectar com afirmação nesse momento de tanto negacionismo, tanta negatividade, de tanto não pode. Queria propor uma pensata poética e musical sobre o que a gente quer. O que uniria as pessoas em valores positivos. É um disco que fala muito de opções, oportunidades, da natureza, da intuição, da própria música, da arte, do amor, dos valores que podem unir a maioria das pessoas  para que a gente possa cruzar esse momento tão difícil e sair, lá na frente, em um momento melhor, fortalecidos e unidos. Achei que não cabia fazer um cancioneiro reclamando sobre a realidade que a gente está vivendo. A internet virou um balcão de reclamação, onde as pessoas despejam um monte de insegurança, insatisfação, infelicidade e eu queria oferecer algo que está em falta, que é justamente esperança, fé no futuro. E um carinho, prazer estético, artístico. É um disco que eu quis conectar com afirmação em vez da negação. A gente já sabe o que não quer. O que a gente quer? O que pode afirmar como valor fundamental como humanidade, civilização? Então é isso: é educação, é cultura, é o amor, a gentileza, a ciência, o saber, a natureza, a intuição e as opções, as oportunidades, as escolhas que a gente sempre tem, né? Sem negar esse momento histórico terrível, tristíssimo e dramático que a gente está vivendo, mas com um olhar mais otimista para o futuro, sabendo que a gente vai sair dessa. Aguardo ansiosamente por esse momento, tenho fé no futuro. Meu olhar é de esperança, de positividade.

BBMag: Você tem um fã-clube grande em Londres. Você tem planos de regressar com um show, ou com Tribalistas ou individualmente? Londres é um mercado importante pra você?

Marisa: Claro! Certamente será com um show meu, mas acho que só em 2022. Porque é preciso muita segurança pra colocar uma equipe inteira na estrada, pegar avião, hotel, ir para várias cidades, pensa… Quero muito ir, adoro Londres, já passei dois meses estudando na cidade, adoro a Inglaterra. E assim que for possível, vamos nos organizar para ir cantar com o público, sejam brasileiros, ingleses ou de outras nacionalidades. Vai ser uma alegria pra mim!

BBMag: Uma última mensagem para seus fãs de Londres!

Marisa: Um beijo grande pra todos, estou com saudades e espero que tudo isso passe logo pra gente poder se encontrar e cantar junto!

BBMag: Foi um prazer falar com você! Sucesso com o novo álbum e espero que a gente possa ver seu show em breve!

Marisa: Muito obrigada!

Crédito Foto: Leo Aversa

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